O homem, estranho a si, é do homem ignorado,
onde estou, onde vou, quem sou, donde tirado?
Átomos em tortura em lama que se empasta,
cuja sorte se joga e a morte então arrasta,
mas postos a pensar, e átomos que vivem,
guiados pela mente, os céus que já medirem;
ao seio do infinito aspira o nosso ser,
sem um momento só nos ver, nos conhecer.
O mundo, este teatro, orgulho e erro abalam,
e é de infortúnios só que de ventura falem.
Busca-se o bem-estar em queixas a jemer:
a morte ninguém quer, ninguém quer renascer.
Às vezes, quando a dor os dias consagramos,
pela mão de prazer se vai e como a sombra passa;
sem conta nossos são perdas, choro e desgraça.
O passado é-nos só uma lembrança triste;
e o presente é atroz, se o porvir não existe,
se a noite tumular no ser que pensa avança.
“Bem será tudo um dia”, é essa a vossa esp’rança;
“Hoje tudo está bem”, é essa a ilusão.
Com sábios me enganei e só Deus tem razão.
Humilde nos meus ais, sofrendo em impotência,
eu não atacarei porém a Providência.
Viram que outrora em tom não lúgubre cantei
do mais doce prazer a sedutora lei,
outro tempo e costume: a idade dá sejaza,
do humano extraviar partilho ora a fraqueza,
quero na treva espessa a mim iluminar,
e apenas sei sofrer e já não murmurar.
Um cálice, como a sua hora desse,
Ao seu Deus foi dizer apenas me prece:
“Ser sem limite e rei único na verdade,
trago-te o que não tens na tua imensidade,
faltas, erro, ignorância e males com pujança”.
Mas ‘inda ele juntar podia a esperança.
Voltaire,
Póeme ser le desastre de Lisbonne.
terça-feira, setembro 16, 2008
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